segunda-feira, 19 de novembro de 2007

UM SENHOR

O nome de Vítor Baía nunca deixou de ser falado no FC Porto, nem mesmo quando saiu e rumou a Barcelona. Agora que terminou a carreira, e vestiu a pele de dirigente, os adeptos continuam a ir ter com ele sabendo que encontrarão um discurso sensato e sempre na defesa dos interesses do clube. Na terceira viagem na condição de director das Relações Externas do FC Porto, em entrevista a O JOGO Vítor Baía não mostrou os trunfos quanto ao futuro, mas foi deixando nas entrelinhas indicadores do que pode suceder. Inscreveu-se na universidade para tirar um curso de gestão desportiva e não quer ficar por aqui, sinal de que está a fazer uma preparação no dirigismo, como o próprio confessou. Sem querer queimar etapas, talvez a única certeza que se tenha é que continuará ligado ao clube que ama desde que nasceu. Pelo meio fez uma análise à equipa, mostrando-se confiante na revalidação do título, tocando também nos assuntos Barcelona e Scolari.

Já conseguiu habituar-se ao dia-a-dia sem futebol? Já libertou as toxinas todas?
(longa pausa) Digam
os que sim. Quando assumi que ia deixar de jogar futebol, a minha forma de pensar modificou logo. Terminei quando achei que devia terminar e não há que lamentar nada, há sim muito para recordar, coisas boas que fiz. Tive uma carreira, não posso cansar de dizê-lo, a todos os níveis brilhante, recheada de títulos e de coisas boas. Mas terminou. Foi um ciclo que se fechou e há que trabalhar, virar as baterias para outro ciclo que espero que também esteja ao mesmo nível do ciclo que acabou.

As pessoas questionam-se acerca do que faz e do cargo que ocupa. O que faz exactamente no dia-a-dia?
Tenho o meu gabinete. Estou a chefiar um departamento, mas não estou preso, nem tenho que estar sempre no gabinete. Tenho que estar quando tenho reuniões e trabalho para fazer, porque tenho uma agenda. Estou na faculdade, todos os dias de manhã e sempre que há necessidade de estar no Dragão, estou. E depois tenho algo muito importante, e que não fiz sempre quando era jogador, que é dedicar-me aos meus filhos. Prezo muito ser um pai presente na educação dos meus filhos. Tento também tratar um pouco da minha saúde, fazendo ginásio e, tendo umas condições extraordinárias como
as do Parque da Cidade do Porto, também me podem ver lá a correr.

Terminou a carreira como sendo o jogador com mais títulos conquistados. Ambiciona coleccionar os mesmos títulos, mas como dirigente?
Eu quero é fazer um trabalho válido, de qualidade e sério como dirigente. Não nasci dirigente e as coisas vão-se proporcionando. Também não nasci jogador e as coisas foram evoluindo nesse sentido. Estou a fazer a minha preparação como dirigente. Não é por acaso que voltei à universidade, estou a fazer o curso de gestão de desporto e estou a sentir-me muito bem. É um curso de três anos. Só tenho a ganhar com isso, faz parte da minha evolução natural e do meu crescimento a outros níveis.
É um curso que me pode ser bastante útil, como outros que também penso vir a tirar, mais direccionado para o futebol, para o dirigismo futebolístico. Não obrigatoriamente em Portugal, mas tenho outros objectivos, que podem abranger cursos essenciais e federações importantes do dirigismo, que tem exactamente que ver com esta vertente. Na minha vida trato de fazer as coisas de uma forma cuidada, bem pensada e, acima de tudo, estruturada. Não pretendo saltar etapas.

Falando do presente. Tem projectos, ideias e 'timings', mas que se calhar não revela... Este cargo de director de Relações Externas é uma etapa para depois chegar a outras funções?
A única coisa que
eu quero é poder ser útil ao clube nestas funções. O clube acha que eu posso ser mais útil nestas funções e eu tento fazer o melhor que posso na defesa da imagem do FC Porto a nível nacional e internacional.

Rui Costa poderá abraçar uma função de dirigente no Benfica. Já imaginou um duelo com ele de fato e gravata a lutarem por títulos?
(risos) Vocês conhecem-me e eu não faço esse tipo de previsões. Tudo a seu tempo. Neste momento, é este o meu pensamento e a minha ambição. É este o caminho que tenho de percorrer. Não penso em algo mais do que isto, mas depois
há a especulação jornalística…

As pessoas não lhe dizem para ser presidente um dia mais tarde?
As pessoas demonstram o carinho a alguém que deu tudo o que tinha ao FC Porto, a alguém que demonstrou gostar do clube e do que fazia, defendendo os interesses do emblema. Isso é gratificante, ver que vale a pena ser-se sério e ir ao máximo das nossas capacidades, passar por sacrifícios. Vale a pena sofrer e, acima de tudo, ter apostado numa carreira que deu
os frutos que deu. E ainda por cima, aliado a isso, há o facto de ser portista e de ter nascido futebolisticamente neste clube. Isso é o que mais retiro quando as pessoas falam comigo. Sabem reconhecer isso, serem justas e gratas. As pessoas são gratas e isso é o melhor que podemos ter. Estamos num desporto em que a ingratidão está de mãos dadas com todos os fenómenos.

O percalço na Amadora pode abalar a equipa? Não. Conheço bem a estrutura da equipa e a capacidade das pessoas que estão à frente do clube, bem como a qualidade e a capacidade dos jogadores, e isto será apenas um motivo de maior união. Não será um motivo de preocupação, antes de querer voltar rápido às vitórias.

O FC Porto vai ser campeão?
É o objectivo principal. Por norma, adormecemos e acordamos a pensar em sermos campeões. Mas isso acontece desde meninos, é algo espontâneo querer e lutar para sermos campeões. A confiança mantém-se exactamente na mesma em relação ao início da época.

Considera que seria particularmente interessante ser campeão no primeiro ano na pele de dirigente?
Era giro, motivante e algo que iria motivar uma recordação maior por ser o primeiro título enquanto dirigente, embora as minhas funções não estejam directamente ligadas à equipa. O contacto que tenho com a equipa e todo o staff tem que ver com as viagens que faço em termos de Liga dos Campeões. No dia-a-dia não tenho qualquer ligação à equipa. Estou a comandar um departamento que não está directamente ligado ao
campo, mas sei como está a equipa e a forma como evolui. Por isso, tenho uma confiança enorme de que as coisas voltarão rapidamente ao seu rumo normal.

Este jogo na Amadora fez lembrar-lhe a partida de há duas épocas, quando era jogador?
São jogos distintos. Nesse jogo, infelizmente, começámos a perder e não conseguimos dar a volta ao resultado. Perdemos e acabou por ser de má memória, porque infelizmente o único erro que tive na altura acabou por me custar o lugar. Mas já nem vale a pena falar disso, é passado. As situações não são equiparáveis.

Os níveis de popularidade mantêm-se?
Sim, felizmente. É uma realidade que tem que ver com a minha carreira, postura e o trabalho na Fundação Baía 99, que é algo muito importante e que esqueci de realçar atrás. Aliás, deve ser dos trabalhos mais importantes que faço. Continuo o meu trabalho ao nível da Fundação, atingindo níveis cada vez mais elevados, isto é, conseguir chegar a todas as zonas do país, não a todos os sítios, mas a todo o lado. É uma Fundação nacional e não apenas direccionada para o Porto. É um trabalho que me preenche muito tempo, mas que me dá um grande prazer pessoal. Portanto, o meu dia-a-dia anda à volta da Fundação, faculdade, dos afazeres derivados da minha profissão e família. Já não dá para pensar em mais nada.

E que tipo de feedback tem recebido das pessoas? Fazem-lhe queixas sabendo que agora é dirigente?
Ouço críticas e opiniões de adeptos normais. Noto que as pessoas têm um certo à-vontade em falarem comigo de situações relacionadas com determinados jogos, que se passam numa ou noutra partida. São situações normais de um adepto, e aí compreendo-as, mas depois atenuo as queixas no papel de director. No entanto, não há muitas queixas da equipa, porque tem estado excelente, exceptuando os últimos dois jogos.

O percurso do FC Porto na Liga dos Campeões na época de 2003/04, que acabou com a conquista do troféu, continua a estar marcada na memória de todos os jogadores e adeptos dos bicampeões nacionais.
Não havia um desejo secreto de sermos campeões europeus. Havia sim uma confiança que não conseguíamos explicar. Vou contar uma história curiosa. Estávamos todos a ver o sorteio da Liga dos Campeões e, quando nos saiu o Manchester United, começámos aos saltos e ficám
os todos contentes. Foi uma situação íntima. Dissemos logo ali que íamos eliminar o Manchester.

E será que agora há algum paralelismo com o presente?
Esta equipa tem vindo a evoluir, a ganhar experiência a este nível e também pode fazer a sua história. Estou convencido que o FC Porto pode fazer coisas bonitas a nível internacional.
Falou em sofrimento na carreira. Jogou lesionado num jogo do Barcelona com o Dínamo de Kiev e acabou por prejudicar-lhe o percurso naquele clube. Voltaria a fazer o mesmo? Tem a ver com a minha maneira de ser e sei que por vezes acabei por sair prejudicado. Outras vezes arrisquei e acabei por sair beneficiado. É uma questão de estado de espírito. Cheguei a Barcelona, era a minha entidade patronal, mas não tinha um afecto. Depois comecei a sentir um carinho especial, porque comecei a conhecer o clube e reparei que se assemelhava muito ao FC Porto em certas lutas. Mas eu nem tinha que o fazer, porque tinha companheiros com dores de cabeça ou de barriga e não jogavam por causa disso. Isso fazia-me uma grande confusão, porque vinha da escola do FC Porto. Se não tivesse esta forma de pensar, de ir à luta, de ir lá para dentro dar tudo o que tenho e depois logo se vê, sem me preocupar com consequências… Tudo o que queria era ajudar. No FC Porto foi exactamente o mesmo. Não me arrependo de nada, embora na questão de Barcelona tenha sido prejudicado. Aliás, o meu ciclo em Barcelona termina precisamente por causa desse jogo.

Van Gaal ou Scolari. A qual dos dois apertava a mão primeiro?
Não sou pessoa de rancor. Acho que o pior que pode haver é as pessoas em determinadas situações não terem a consciência tranquila em relação ao que se passou comigo. Em relação a esses treinadores, como pessoa educada que sou, se me cruzar com eles não terei problema nenhum em cumprimentá-los. A consciência de cada um é que pode não estar tão limpa e segura.

Continua a pensar que esse afastamento da Selecção Nacional é algo negativo na sua carreira?
É um momento menos bom, admito isso. Tive que passar por essa situação sem ter uma explicação, mas já é um capítulo encerrado. Não há nada a acrescentar e a vida cont
inua.

Qual foi o objectivo desta viagem a Toronto?
Participar no 20º aniversário da Casa do FC Porto de Toronto e estar junto de pessoas que têm uma coisa em comum, que é o amor pelo clube. Queremos que a imagem que passa do FC Porto sejapositiva, com as pessoas a sentirem-se satisfeitas, porque sabemos que passam por sacrifícios em prol do clube, desde as infra-estruturas às condições que proporcionam aos seus sócios. Falo da Casa do FC Porto de Toronto, mas também num plano geral. São pessoas com uma sensibilidade tremenda, que vivem este fenómeno de uma forma apaixonada.

Sente-se bem na pele de embaixador?
Sou director do departamento de Relações Externas, ou relações internacionais, e tenho que zelar pela imagem externa do FC Porto. Foi com uma certa expectativa que fiz esta viagem, porque foi também a primeira vez que viajei na condição de chefe de delegação do FC Porto nestas funções. Estava muito curioso para ver a reacção das pessoas, porque agora é muito diferente de quando era jogador. Estava curioso para estar com pessoas que já conhecia desde a última passagem do FC Porto por Toronto e espero, acima de tudo porque as responsabilidades são outras, que a missão do Canadá tenha sido bem sucedida para que todos tenham ficado contentes com a nossa visita.

Quaresma não vai mesmo sair do FC Porto?
O meu departamento não é esse [risos], mas se me perguntarem como adepto e amigo, espero que o Quaresma continue muitos anos no FC Porto.

Quando terminou a carreira deixou alguém no balneário para assumir as funções que desempenhava?
Há sempre jogadores importantes em termos de balneário. Temos o Pedro Emanuel, que é o capitão com toda a justiça, porque é uma pessoa com personalidade vincada e que pode ajudar e muito os jovens. Depois temos aqueles que embora jovens já têm um passado importante no clube, como são os casos do Bruno Alves, Bosingwa, Hélder Postiga e o próprio Quaresma. O Raul Meireles também está nessa
linha.

Mas, para os adeptos, são jogadores que não têm o peso que o Vítor Baía teve…
Isso é normal com a idade que têm. Com esse peso temos o Pedro Emanuel. Eu também não nasci assim, fui crescendo e evoluindo ao longo do tempo com a experiência diária. E estes jogadores já denotam com a idade que têm uma capacidade e personalidade fortes, podendo seguir esse caminho.

Na festa de recepção em Toronto, na sexta-feira, Vítor Baía já tinha sentido o carinho dos adeptos portistas do Canadá, mas nada comparado com o que se passou ontem, num almoço-convívio que assinalou os festejos do 20º aniversário da Casa do FC Porto daquela cidade.

Um pouco mais de seis centenas de adeptos quiseram ver de perto e confraternizar com o símbolo do FC Porto que é Vítor Baía, num ambiente que chegou a ficar marcado por momentos de autêntica loucura. O ex-guarda-redes e actual Director de Relações Externas do FC Porto retribuiu com sorrisos e autógrafos, que, de resto, se prolongaram por largos minutos. Muitas vezes emocionado, Vítor Baía agradeceu o apoio dos adeptos e referiu que jamais esquecerá o carinho da comunidade portuguesa de Toronto. "Esta é a primeira viagem que faço junto das comunidades portuguesas e das filiais do FC Porto e foram espectaculares os momentos que passei em Toronto. Levo-os no meu coração", disse.

Após o almoço foi lida uma mensagem de Pinto da Costa - "os dragões de Toronto são parte notável e importante do nosso orgulho", escreveu o presidente -, incluída numa revista expressamente feita para assinalar o momento, mas foi o discurso de Manuela Aguiar, membro das filiais e delegações do FC Porto, que deixou a sala a ferver. "O FC Porto é o rosto vitorioso de Portugal. É o clube que tem dado a Portugal aquilo que a Selecção Nacional nunca deu. Somos o que de Portugal tem de melhor e, se o futebol é o domínio onde o nosso país mais tem brilhado, é graças ao FC Porto. Ao FC Porto de Pinto da Costa e ao FC Porto de Vítor Baía. Vamos conquistar o tricampeonato e a Liga dos Campeões", disse, claramente entusiasmada, Manuela Aguiar.

Depois dos discursos houve trocas de lembranças e foi nessa altura que Vítor Baía ficou inscrito como sócio honorário da Casa do FC Porto de Toronto. Antes do final do convívio, duas camisolas do ex-guarda-redes foram também leiloadas e o valor das licitações chegaram aos dois mil e 1500 dólares, respectivamente, revertendo as verbas para a Fundação Baía 99. Também para agradecer o trabalho comunitário de Vítor Baía, mais de mil dólares foram oferecidos à Fundação que dirige.

Disseram-lhe que iam às compras e Vítor Baía esfregou as mãos de contente, mas afinal foi conduzido sem saber até ao Air Canada Centre para ver o jogo entre o Toronto Maple Leafs e o Otawa Senators, na companhia de Rui Cerqueira, responsável pela área de comunicações do clube, Cesário Brás, presidente da Casa de Toronto, e o seu filho, Jason Brás.

Tomaz de Andrade - In O Jogo Online de 19.11.2007




2 comentários:

Paulo Pereira disse...

SEM DÚVIDA K O TÍTULO É APROPRIADO. BAIA FOI CAMPEÃO DENTRO E FORA DOS RELVADOS, RESPONDENDO COM CLASSE ÀS ATOARDAS DE SCOLARI, NUMA EVIDENTE DEMONSTRAÇÃO DE K O CARACTER DELE DÁ UMA GOLEADA AO SELECCIONADOR DA TRETA QUE TEMOS.

ABRAÇO,

Sérgio de Oliveira disse...

Como já há muito escrevi é uma questão de tempo , e veremos BAÍA PRESIDENTE .